
acompanham os passos da tua silhueta
reflexos de ti
invadem as águas serenas
e preenchem o meu horizonte
em ecos fugazes
assola-me o murmúrio da tua ausência.
João Carlos Esteves
Um poeta é um rouxinol que se senta na escuridão, e canta para se confortar da própria solidão com seus próprios sons. Seus ouvintes são homens arrebatados pela melodia de uma musica invisível, que se sentem comovidos e em paz, ainda que não saibam como nem porquê” (Percy Bysshe Shelley)
vem comigo
ver as pirâmides fantásticas do vento
no interior luminoso da terra encontrarás
o segredo de quartzo para desvendares o tempo
onde contemplamos a fulva doçura das cerejas
iremos para onde os restos de vida não acordem
a dor da imensa árvore a sombra
dos cabelos carregados de pólens e de astros
crescemos lado a lado com o dragão
o súbito relâmpago dos frutos amadurecendo
iluminará por um instante as águas do jardim
e o alecrim perfumará os notívagos passos
há muito prisioneiros no barro
onde o rosto se transforme e morre
e já não nos pertence
vem comigo
praticar essa arte imemorial de quem espera
não se sabe o quê junto à janela
encolho-me
como se fechasse uma gaveta para sempre
caminhasse onde caiu um lenço
mas levanto os olhos
quando o verão entra pelo quarto e devassa
esta humilde existência de papel
vem comigo
as palavras nada podem revelar
esqueci-as quase todas onde vislumbro um fogo
pegando fogo ao corpo mais próximo do meu
O amor é um tiro no espelho
intangível ao corpo estilhaçado.
Harmônico silêncio de ruínas,
tão puro de beijar e se ferir
de inocência.
Raul Macedo
in Disjecta Membra
E de mansinho as palavras chegam
tocam-me os silêncios do rosto
e escrevem os textos que me roubaram a voz.
Tão meigas e suaves, as palavras,
Só elas, a escorrerem tristezas na quietude
da noite molhada de vento...
Só as palavras, com dedos feiticeiros
a tecerem alquimias, a sararem feridas,
a encontrarem saídas e luzes em túneis escuros.
Ana Mateus
Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?
E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas".
Olavo Bilac
a mulher muito amada passou ligeira
deixando o silêncio como uma
sombra surgir pelas pedras
à minha frente
lembrei alguém do passado com seu olhar indagando
sobre um segredo ainda não dito nem revelado
é fácil banhar com água límpida
fria
meu rosto
a memória reencontra no mesmo instante teu corpo
em busca do meu para salvar minha existência
dizendo muda para não ir embora que já
era tarde para procurar meu caminho
foi difícil esquecer tua carne teu
sangue teu cheiro de mar
com o perfume de sal
entranhando minhas
narinas
não se espantem eu dizer a mesma coisa
meu amor continua igual em todas suas
formas as palavras mudam a cada
momento mas sua essência
seu significado é sempre
você
contemplando meu sono alcançando meu sonho
Franco Terranova
Imagem via Pinterest
Dentro de mim mora um peixe
de olhos e escamas azuis: - navega
contra a corrente
no mar vermelho das minhas veias
e segue em busca da luz.
Desconhece as nascentes, pois
se formou no limbo:- meu coração.
Não quero. Não deixarei que parta
junto à primeira lágrima.
- Bicho de mim: - eu cuido.
Nydia Bonetti
Imagem via Pinterest
não possa tanta distância
deixar entre nós
este sol
que se põe
entre uma onda
e outra onda
no oceano dos lençóis
Paulo Leminski
in Caprichos & Relaxos
Desconheço a autoria da imagem
E o que é o amor
senão a pressa
da presa
em prender-se?
A pressa
da presa
em
perder-se.
Ana Martins Marques
in Da arte das armadilhas