Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina

terça-feira, 31 de outubro de 2017

Soneto da perdida esperança

Hoje é aniversário do poeta. Salve, salve Drummond. O nascer do sol de Copa é pra você.

Perdi o bonde e a esperança. 
Volto pálido para casa. 
A rua é inútil e nenhum auto 
passaria sobre meu corpo.

Vou subir a ladeira lenta 
em que os caminhos se fundem. 
Todos eles conduzem ao 
princípio do drama e da flora.

Não sei se estou sofrendo 
ou se é alguém que se diverte 
por que não? na noite escassa

com um insolúvel flautim. 
Entretanto há muito tempo 
nós gritamos: sim! ao eterno.

Carlos Drumond de Andrade


sexta-feira, 27 de outubro de 2017

De alma e de corpo


Imagem: Pinterest

quando me despi de todas as vontades, 
passei fome. 
a coisa faminta escravizou o que eu era, 
emudeceu o que eu seria. 
e na letargia da pele cinza, da rua fria, 
descobri que não nasci pra mudez.
a mudez que me vestia de pudores, 
que me sugava os poderes 
e alimentava predadores.
a tensa e boa nudez da minha alma... 
é a letra crua, cheia de vontades, 
certa de desejos e deserta de sutilezas vis. 
foi assim, por um triz, que me abandonei num falso porto. 
e retornei juntando as postas. e me refiz de alma e corpo.

Mario Liz


quinta-feira, 26 de outubro de 2017


Tela "O Grito" de Edvard Munch

Quem é que não se lembra
Daquele grito que parecia trovão?
– É que ontem
Soltei meu grito de revolta.
Meu grito de revolta ecoou pelos vales mais longínquos da Terra,
Atravessou os mares e os oceanos,
Transpôs os Himalaias de todo o Mundo,
Não respeitou fronteiras
E fez vibrar meu peito

Meu grito de revolta fez vibrar os peitos de todos os Homens,
Confraternizou todos os Homens
E transformou a Vida

Ah! O meu grito de revolta que percorreu o Mundo,
Que não transpôs o Mundo, 
O Mundo que sou eu!

Ah! O meu grito de revolta que feneceu lá longe,
Muito longe,
Na minha garganta!

Na garganta de todos os Homens

Amilcar Cabral

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Olá, mãe


Crédito da imagem: Pinterest

Há ainda, no teu quarto, 
aquela figura de Fátima que sempre te acompanhou. 
Estás lá. Lá, dizemos-te olá, mãe.

Há ainda, na sala, 
junto à porta que dá para o alpendre, aquele cadeirão 
no qual te sentavas para teres luz para as costuras. 
Estás lá. Lá, dizemos-te olá, mãe.

Há ainda, na cozinha, 
cada objecto no lugar onde os deixaste. 
Estás lá. Lá, dizemos-te olá, mãe.

Há ainda, lá fora, 
os vasos dispostos como os dispuseste. 
Alguns já começaram a partir, mas vamos tentar deixá-los lá 
pelo tempo que forem resistindo. 
Porque estás lá. E lá queremos dizer-te olá, mãe.

Há ainda, em nós, muito de ti. 
Mãe: lembramo-nos de ti, nunca te esquecemos – 
muitas vezes, quando fechamos os olhos, 
é para te dizermos olá.

Olá, mãe. Nos meus olhos não há água. 
Sou ainda o menino que deixaste na escola pela primeira vez 
e a quem disseste para não chorar. Não choro, 
mas a escola da vida, ao contrário da dos livros, precisava de ti. 
Contigo, aprendi o amor eterno: 
o que só existe quando alguém não sai de nós. 
Saíste do mundo dos outros 
mas não saíste do mundo dos que te amam. 
Não saíste dele, não saíste de mim. 
[De mão no peito] Não saíste daqui – Olá, mãe!

Fazes anos hoje, porque ainda nos vives. 
E penso em tudo quanto me lembra de ti,
como se tudo fosse um teu “Olá, filho”.

Sérgio Lizardo


terça-feira, 24 de outubro de 2017

Os afetos


Pintura: "The Good People - Secrets", by Michelle Bird

Porque o quadrado da hipotenusa
é igual a já não sei quê dos catetos
a traça do passado é tão confusa
mas tão límpida a lembrança dos afetos
são fartos e temíveis
são as cordas sensíveis
quietos irrequietos
p'ra sempre
politicamente incorretos
os afetos, os afetos.

Sérgio Godinho


sábado, 21 de outubro de 2017


fotografia de Roseana Murray

Esse jardim
tem cheiro de algas.
Um pedaço do mar
se aloja entre as flores
e sua música
vagueia mais que perfume.
Esse jardim está aqui
e além,
se desdobra até onde
o olhar não alcança,
até o moinho
de fabricar beleza.

Roseana Murray





quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Soneto da Saudade




Acrilic on Canvas "Bisou", by Beata Chrzanowska

Quando sentires a saudade retroar
Fecha os teus olhos e verás o meu sorriso
E ternamente te direi a sussurrar:
O nosso amor a cada instante está mais vivo

Quem sabe ainda vibrará em teus ouvidos
Uma voz macia a recitar muitos poemas
E a te expressar que este amor em nós ungindo
Suportará toda distância sem problemas

Quiçá, teus lábios sentirão um beijo leve
Como uma pluma a flutuar por sobre a neve
Como uma gota de orvalho indo ao chão.
Lembrar-te-ás toda ternura que expressamos,
Sempre que juntos, a emoção que partilhamos
Nem a distância apaga a chama da paixão.

Guimarães Rosa

sexta-feira, 13 de outubro de 2017


Imagem Google

De que serviu ir correr mundo,
arrastar, de cidade em cidade, um amor
que pesava mais do que mil malas; mostrar
a mil homens o teu nome escrito em mil
alfabetos e uma estampa do teu rosto
que eu julgava feliz? De que me serviu

recusar esses mil homens, e os outros mil
que fizeram de tudo para eu parar, mil
vezes me penteando as pregas do vestido
cansado de viagens, ou dizendo o seu nome
tão bonito em mil línguas que eu nunca
entenderia? Porque era apenas atrás de ti

que eu corria o mundo, era com a tua voz
nos meus ouvidos que eu arrastava o fardo
do amor de cidade em cidade, o teu nome
nos meus lábios de cidade em cidade, o teu
rosto nos meus olhos durante toda a viagem,

mas tu partias sempre na véspera de eu chegar.

Maria do Rosário Pedreira 
in Nenhum Nome Depois


Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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