Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina

segunda-feira, 27 de novembro de 2017

As minhas ovelhas


fotografia de Hugh Kretschmer

Eu cuidarei das ovelhas órfãs,
elas serão para mim depois da guerra.
Eu lhes darei o pão, abrigo e delírios,
improvisaremos todas às noites
serenatas infantis, roubaremos as vozes dos insetos.
Eu serei delas de sol a sol. 
Depois que fecharem o comércio,
as levarei para passeios noturnos.
Faremos caminhadas pela floresta,
permitirei que comam o orvalho
morto estirado sobre as folhas.
Juntos aprenderemos a conduzir 
a chuva para lugares estranhos,
daremos nomes aos trovões.
Eu porei fotografias das minhas ovelhas
em estampas de camisetas
com frases em língua forasteira,
ganharei o dinheiro para acender 
a fogueira onde nos aqueceremos:
“keep calm and kiss a sheep”, 
“live love dream. Be a sheep.”,
“enjoy the world like a sheep.” 
Elas se amarão no jardim do Éden, 
no limbo, ou em Andaluzia.
Comprarei para elas casas noturnas,
onde não haverá músicas de plástico.
Aprenderão a dançar ao redor do planeta,
lhes contarei toda a vida de García Lorca,
depois amaldiçoaremos os covardes.
Algumas terão pensamentos cor de rosa,
as tímidas usarão brincos e cabelos vermelhos,
não tomarão veneno às sextas-feiras.
As minhas ovelhas terão suas religiões,
ou poderão não acreditar no que veem. 
Eu serei para elas, usarei roupas simples,
comerei o necessário para caminhar,
beberei a água das árvores.
Eu amarei as minhas ovelhas,
antes do amanhecer olharemos o céu,
exercitaremos nossa imaginação.
A cada uma será dado o tempo
para contar a história da sua viagem.
Eu lhes direi o segredo dos pássaros,
seus atrevimentos com as nuvens.
Eles não fecham os olhos ao vento,
não têm receio das alturas.
Os pássaros são muito românticos.
Minhas ovelhas e eu, entre estátuas crucificadas,
estaremos iniciando mais um dia,
com os nossos passos condenados sobre a Terra.

Edmir Carvalho Bezerra

sexta-feira, 10 de novembro de 2017


Imagem: Google

há um pouco de cansaço em mim
há uma curva, sinistra ou sinuosa, 
à esquerda do mundo, do peito
do meu país sangrento

meu coração à esquerda , estraçalhado,
esmigalhado no asfalto,
à esquerda sangrando
sem cerimônia de adeus

meu país foi comprar cigarros
e não voltou mais

Patricia Porto


terça-feira, 7 de novembro de 2017

Vem ver-me

                                                               
"Torque de repouso"_ desenho de Fred hatt

Vem ver-me antes que morra de amor - o sangue
arrefece dentro do meu corpo e as rosas desbotam
nas minhas mãos. Da minha cama ouço a tempestade
nos continentes; e já quis partir, deixar que o vento
levasse a minha mala por aí; fiz planos de correr mundo
para te esquecer - mas nunca abria a porta.


Vem ver-me enquanto não morro, mas vem de noite - 
a luz sublinha a agonia de um rosto e quero que me recordes
como eu podia ter sido. Da minha cama vejo o sol
tatuar as costas do meu país; e já sonhei que o perseguia,
que desenhava o teu nome no veludo da areia e sentia
a vida pulsar nessa palavra como o músculo tenso
escondido sob a pele - mas depois acordava e não ia.


Vem ver-me antes que morra, mas vem depressa -
os livros resvalam-me do colo e o bolor avança
sobre a roupa. Da minha cama sinto o perfume das folhas
tombadas nos caminhos. O Outono chegou. E o quarto
ficou tão frio de repente. E tu sem vires. Agora
quero deitar-me no tapete de musgo do jardim e ouvir
bater o coração da terra no meu peito. Os vermes
alimentam-se dos sonhos de quem morre. E tu não vens.

Maria do Rosário Pedreira
Canto do Vento nos Ciprestes
(2001)



quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Arte taciturna




Em meu ofício ou arte taciturna
Exercido na noite silenciosa
Quando somente a lua se enfurece
E os amantes jazem no leito
Com todas as suas mágoas nos braços,
Trabalho junto à luz que canta
Não por glória ou pão
Nem por pompa ou tráfico de encantos
Nos palcos de marfim
Mas pelo mínimo salário
De seu mais secreto coração.

Escrevo estas páginas de espuma
Não para o homem orgulhoso
Que se afasta da lua enfurecida
Nem para os mortos de alta estirpe
Com seus salmos e rouxinóis,
Mas para os amantes, seus braços
Que enlaçam as dores dos séculos,
Que não me pagam nem me elogiam
E ignoram meu ofício ou minha arte.

Dylan Thomas
(Tradução: Ivan Junqueira)



Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

Postagens populares

Total de visualizações de página