Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina

domingo, 31 de maio de 2009

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Não sou a areia
onde se desenha um par de asa
sou grades diante de uma janela.
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Não sou apenas a pedra que rola
nas marés do mundo,
em cada praia renascendo outra.
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Sou a orelha encostada na concha
da vida, sou construção e desmoronamento,
servo e senhor, e sou mistério
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A quatro mãos escrevemos este roteiro
para o palco de meu tempo:
o meu destino e eu.
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Nem sempre estamos afinados,
nem sempre nos levamos
a sério.
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Lya Luft
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sábado, 30 de maio de 2009

"Lágrima"

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Denso, mas transparente
Como uma lágrima...Quem me dera
Um poema assim!
Mas...Este rascar de pena! Esse
Ringir das articulações ...Não ouves?!
Ai do poema
Que assim escreve a mão infiel
Enquanto - em silêncio - a pobre alma
Pacientemente espera.
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Mario Quintana
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sexta-feira, 29 de maio de 2009

"Cumplicidade"

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Acordei com vontade de te dar meu olhar.

Queria que o guardasses para mim
Naquela tua caixinha de porcelana
Que tens na cabeceira da cama
E onde todas as noites, antes de dormir,
Guardas delicadamente
Os sonhos que não queres ter.
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Oswaldo Antônio Begiato
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quinta-feira, 28 de maio de 2009

"Degustação"

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Da batata da tua perna
À maçã do teu rosto
Sinto teu gosto
E sinto que gosto
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Juliano Osterlund
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quarta-feira, 27 de maio de 2009

"Janela Aberta"

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Chegaste em minha vida
como uma janela aberta
numa casa vazia e triste.
Trouxeste um dia de sol
um aceno de folhagem
um canto de pássaro.
Que importa se continuo a ser
a mesma casa triste e vazia?
Debruçado à janela, agora,
posso te ver passar... todo dia...
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J. G. de Araújo Jorge
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terça-feira, 26 de maio de 2009

"Só Tu"

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'Dos lábios que me beijaram,

Dos braços que me abraçaram

Já não me lembro, nem sei...

São tantas as que me amaram!

São tantas as que eu amei!

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Mas tu - que rude contraste!

Tu, que jamais me beijaste,

Tu, que jamais abracei,

Só tu, nest'alma, ficaste,

De todas as que eu amei.

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Paulo Setúbal

in 'Alma Cabocla'

segunda-feira, 25 de maio de 2009

"Simultaneidade"

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- Eu amo o mundo!
Eu detesto o mundo!
Eu creio em Deus!
Deus é um absurdo!
Eu vou me matar!
Eu quero viver!
- Você é louco?
- Não, sou poeta.
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Mario Quintana
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domingo, 24 de maio de 2009

"Piedosa Mentira"

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Ontem na tarde loura e de aquarela,
alguém me perguntou: “Como vai ela?
Como vai teu amor?” - Eu respondi: "Não sei.
Uma mulher passou na minha vida,
mas não lembro… ” E, nessa hora comovida,
como nunca lembrava-me de ti!
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E menti por pudor… A mágoa que alvoroça
nosso peito é tão santa, tão pura, tão nossa
que se esconde aos demais.
E se uma voz indaga contristada:
"Estás sofrendo?” - “Não, não tenho nada…”
E é quando a gente sofre mais…
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Menotti Del Picchia
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sábado, 23 de maio de 2009

"Confluência Passional"

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Imaginem rios que se querem
e se esperem presos pelo cheiro
se arrastem tortos pelo mundo
afagando o leito em desespero...
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Imaginem rios que se gostem
e se encostem longos de desejos
e se encontrem prontos de ternura
se misturem cada vez mais beijo
e se deixem em êxtase de espuma
troquem águas, algas, mágoas, peixes...
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Altair de Oliveira
in "O Embenedário Diverso"
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quinta-feira, 21 de maio de 2009

"O Amor e o Outro"

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Não amo
melhor
nem pior
do que ninguém.
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Do meu jeito amo
Ora esquisito, ora fogoso,
às vezes aflito
ou ensandecido de gozo.
Já amei
até com nojo.
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Coisas fabulosas
acontecem-me no leito. Nem sempre
de mim dependem, confesso.
O corpo do outro
é que é sempre surpreendente
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Affonso Romano de Sant'Anna
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quarta-feira, 20 de maio de 2009

"Luz Estranha"

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Quem é que na planície abandonada
Vai andando com luz, que até dá medo?
À noite, ninguém passa pela estrada
E o lugar em que moro dorme cedo.
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Que horas serão? Deve ser madrugada.
Insone, já me tem acontecido
Ficar por longas horas à janela
Vendo o dia que nasce e a pôr sentido,
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A ver se sei enfim que luz é aquela,
Luz que já é familiar, embora estranha,
E por tanto me haver surpreendido
Principio a pensar que me acompanha.
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Ribeiro Couto
em Poesias Reunidas
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terça-feira, 19 de maio de 2009

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As cartas de amor
deveriam ser fechadas
com a língua.
Beijadas antes de ser enviadas.
Sopradas. Respiradas.
O esforço do pulmão
capturado pelo envelope,
a letra tremendo
como uma pálpebra.
Não a coisa isenta, neutra,
mas a espuma, a gentileza,
a gripe, o contágio.
Porque a saliva
acalma o machucado.
As cartas de amor
deveriam ser abertas
com os dentes.
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Fabrício Carpinejar
In:"Como no céu"

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segunda-feira, 18 de maio de 2009

"Antes Soubesse Eu"

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Antes soubesse eu
o que fazer com estrelas na mão.
Se dilacerar-lhes a ponta
ou simplesmente não tocá-las.
Se estão perto cegam meus olhos
Se estão longe as desejo.
Antes soubesse eu
o que fazer com estrelas na mão.
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Hilda Hist
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domingo, 17 de maio de 2009

"Porque"

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Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
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Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
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Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
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Sophia de Mello Breyner Andresen
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sábado, 16 de maio de 2009

"Há nos Teus Olhos Escuros..."

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Há nos teus olhos escuros
Tantas centelhas, que ao vê-las
Penso na treva e nos brilhos
Das noites cheias de estrelas...
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Penso em cousas singulares,
Indagando entre delírios:
Por que é que os céus inda brilham?
Por que não se apaga Sírius?
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Euclides da Cunha
[1888]
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sexta-feira, 15 de maio de 2009

"Despedida"

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Entre mim e o meu amor
hão de se erguer trezentas noites
como trezentas paredes
e o mar será magia entre nós dois.
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Nada haverá, senão lembranças.
Oh tardes que valeram a pena,
noites esperançosas de te ver,
campos de meu caminho,
firmamento que estou vendo e perdendo…
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Definitiva como o mármore,
tua ausência entristecerá outras tardes.
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Jorge Luis Borges
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quinta-feira, 14 de maio de 2009

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Boas e bobas são as coisas que penso,
quando penso em você.
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Caio Fernando Abreu
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quarta-feira, 13 de maio de 2009

"O Navio Negreiro"

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I
...
'Stamos em pleno mar. . . Abrindo as velas
Ao quente arfar das virações marinhas,
Veleiro brigue corre à flor dos mares,
Como roçam na vaga as andorinhas...
...
IV
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Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
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Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
...
V
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Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
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Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!
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Castro Alves

O Poeta dos Escravos

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terça-feira, 12 de maio de 2009

"Cenário"

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Tudo é só, a montanha é só, o mar é só,
A lua ainda é mais só.
Se encontrares alguém
Ele está só também.
Que fazes a estas horas nesta rua?
Que solidão é a tua
Que te faz procurar
O cenário maior,
O de uma solidão maior que a tua?
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Dante Milano
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segunda-feira, 11 de maio de 2009

"Desarvorado Navio"

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A verdade é que depois que tu partiste
vou ficando cada vez mais triste,
cada vez mais morto,
de amor em amor, como um navio
de porto em porto...
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Nesta angústia em que morro,
a olhar o céu vazio,
sem uma estrela para me guiar,
tenho a impressão de que vou acabar, como esse navio,
soçobrando, sem socorro,
na solidão do mar...
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J.G. de Araujo Jorge
in "ESPERA..."- 1960

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domingo, 10 de maio de 2009

"Mãe Dolorosa"

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Vi-o doente, ouvi os seus gemidos;
Sinto a memoria negra, ao recordá-lo!
A Mãe baixava os olhos doloridos
Sobre o Filho. E era a Dôr a contemplá-lo!
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Depois, nesses instantes esquecidos,
Ou lhe falava ou punha-se a beijá-lo...
Mas, retomando, subito, os sentidos,
Estremecia toda em grande abalo!
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Fugia de ao pé dele sufocada,
A sua escura trança desgrenhada,
Os seus olhos abertos de terror!
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E então, num desespêro, a Mãe chorava,
E, por entre gemidos, só gritava:
Amor! amor! amor! amor! amor!
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Teixeira de Pascoaes
in 'Elegias'
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sábado, 9 de maio de 2009

"Formoso é o Fogo"

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Imagem: O Beijo - de Rodin
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Formoso é o fogo e o rosto
da amada junto a ele.
No lume de seu corpo
tudo em redor clareia.
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Depois o que era fogo,
é espuma que se alteia.
E o mundo se faz novo
nas curvas da centelha.
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Já não existe esboço,
mas desenhos, e teimam
— unos e justapostos.
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Já não existe corpo:
são almas que se queimam
no amor de um mesmo sopro.
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Carlos Nejar

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sexta-feira, 8 de maio de 2009

"Tristeza no Céu"

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No céu também há uma hora melancólica.
Hora difícil, em que a dúvida penetra as almas.
Porque fiz o mundo? Deus se pergunta
e se responde: Não sei.
Os anjos olham-no com reprovação,
e plumas caem.Todas as hipóteses:
a graça, a eternidade, o amor
caem, são plumas.
Outra pluma, o céu se desfaz.
Tão manso, nenhum fragor denuncia
o momento entre tudo e nada,
ou seja, a tristeza de Deus.
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Carlos Drummond de Andrade
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quinta-feira, 7 de maio de 2009

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O amor faz monossílabos;
não gasta o tempo com análises compridas;
nem é próprio de boca amante e casta
um chuveiro de frases estendidas;
um volver de olhos lânguidos nos basta
a conhecer as chamas comprimidas;
coração que discorre e faz estio
tem as chaves por dentro e está tranqüilo.
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Machado de Assis
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quarta-feira, 6 de maio de 2009

"Tema Sem Variação"

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Sequer apago as passadas
deste meu vagar sozinho,
sozinho em tantas estradas:
triturador de caminhos,
move-me um remoinho
de frescas águas passadas.
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Geir Campos
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terça-feira, 5 de maio de 2009

"União"

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imagem daqui
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À noite a insônia deita-se comigo.
Dessa união nascem meus poemas e minhas olheiras,
meu deslumbramento noturno,
meu fascínio ante o mistério,
meus medos e minhas vagas
difusas frágeis crenças.
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Anderson Braga Horta
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segunda-feira, 4 de maio de 2009

"Imagem"

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Meu coração tombou na vida
tal qual uma estrela ferida
pela flecha de um caçador.
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Meu coração, feito de chama,
em lugar de sangue, derrama
um longo rio de esplendor.
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Os caminhos do mundo, agora,
ficam semeados de aurora,
não sei o que germinarão.
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Não sei que dias singulares
cobrirão as terras e os mares,
nascidos no meu coração.
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Cecilia Meireles
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domingo, 3 de maio de 2009

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Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha,
E me prendesses toda nos teus barcos...

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Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...
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Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri
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E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
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Florbela Espanca
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sábado, 2 de maio de 2009

"Chovem Duas Chuvas"

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Chovem duas chuvas:
de água e de jasmins
por estes jardins
de flores e de nuvens.
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Sobem dois perfumes
por estes jardins:
de terra e jasmins,
de flores e chuvas.
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E os jasmins são chuvas
e as chuvas, jasmins,
por estes jardins
de perfume e nuvens.
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Cecília Meireles
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sexta-feira, 1 de maio de 2009

Já me matei...

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Já me matei faz muito tempo
Me matei quando o tempo era escasso
e o que havia entre o tempo e o espaço
era o de sempre
nunca mesmo o sempre passo
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Morrer faz bem à vista e ao baço
melhora o ritmo do pulso
e clareia a alma
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Morrer de vez em quando
é a única coisa que me acalma.
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Paulo Leminski
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Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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