Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina

domingo, 31 de outubro de 2010

"Natureza Morta"


Pintura de Celito

E se eu te oferecesse uma rosa vermelha,
da cor do sangue, para que o dia se alegrasse?
Há dias assim, penso nas rosas vermelhas
como se elas tivessem a magia
de tudo transformar.
Talvez me olhasses de outro modo
talvez me oferecesses
plantas do teu jardim
e os frutos maduros do teu pomar.
Talvez o chilrear dos pássaros
nos seduzisse
e eu deixasse de ser uma natureza morta!...

Alexandre de Castro


sábado, 30 de outubro de 2010


Imagem Google

...
Apenas preciso de alguém que me sorria e
reponha o mesmo disco sempre a tocar e
escute comigo o vento nas janelas e
sinta a tristeza que têm os gladíolos murchando
em cima da mesa

Al Berto


sexta-feira, 29 de outubro de 2010

"Pardalzinho"


Imagem Google

O pardalzinho nasceu
Livre. Quebraram-lhe a asa.
Sacha lhe deu uma casa,
Água, comida e carinhos.
Foram cuidados em vão:
A casa era uma prisão,
O pardalzinho morreu.
O corpo Sacha enterrou
No jardim; a alma, essa voou
Para o céu dos passarinhos!

Manuel Bandeira



quinta-feira, 28 de outubro de 2010


"De vinho e rosas", de João Barcelos

O vinho possui a cor das rosas.
O vinho não é, talvez, o sangue da vinha,
mas, sim, o das rosas.
Esta taça não é, talvez, de cristal,
mas de azul do céu coagulado.
A noite não é, talvez, senão a pálpebra do dia.

Omar Khayyam


quarta-feira, 27 de outubro de 2010

"Cantam ao Longe"


"Entardecer em Tiradentes", daqui

Cantam ao longe. Anoitece.
Faz frio pensar na vida;
E a Natureza parece
Dizer, em voz comovida,
Que o Homem não a merece.

Carlos Queirós


terça-feira, 26 de outubro de 2010

Fotografia de Nuno André Monteiro

Em que idioma te direi
este amor sem nome
que é servo e rei?

Como o direi?
Como o calarei?

É como se a noite se molhasse
repentinamente, quando choras.
É como se o dia se demorasse,
quando te espero e tu te demoras.

Albano Martins

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

"As Primeiras Metáforas"


Fotografia daqui

Houve um homem,
anterior a estes e ao abismo.
Chovia. O homem apontou
o céu e disse: «olha como
As nuvens choram». Foi o primeiro.
As palavras eram ainda leves
e, naturalmente, era também possível
dizer coisas belas e imprevistas
como um relâmpago.

Paulo Tavares


domingo, 24 de outubro de 2010

"Os Livros da Minha Infância"


Fotografia daqui

As marcas sépias do tempo
nos livros da minha infância
são como luzes que se perdem
na distância do navio que se liberta do cais

Os livros da minha infância
guardam sonhos de terras distantes,
de cavaleiros andantes
e poetas, jograis, cancioneiros,
de princesas e marinheiros
das barcas vicentinas
que dobravam bojadores,
e frades de negras batinas.

As marcas sépias do tempo
nos livros da minha infância
são o espelho das rugas
que desenham no meu rosto
os caminhos que percorri
desde que os li,

os livros da minha infância

Jorge Santiago


sábado, 23 de outubro de 2010

"Solidão"


Imagem Google

O tilintar dos talheres assinala
que está posta a refeição

A toalha da mesa não revela os cerzidos
onde o tempo e o uso esgarçou as fibras

Difusa
a luz solar
vence a cortina que esvoaça

Em vestígios de uma canção
que aos comensais passa despercebida
andrógina voz canta as vicissitudes da solidão

A senhora tece comentários domésticos
aos quais o esposo assente cabeceando
olhos postos nos próprios pensamentos
ensimesmado num mundo
em tudo diferente deste
onde autômato mastiga engole bebe e concorda
pela conveniência de não imiscuir-se no que considera irrelevante

a mulher fala do factual

alheio
o homem delira
e pede a sobremesa.

Fred Matos


sexta-feira, 22 de outubro de 2010

De palavra em palavra


Fotografia de Tadeu Sales

De palavra em palavra
a noite sobe
aos ramos mais altos
e canta
o êxtase do dia.

Eugénio de Andrade


quinta-feira, 21 de outubro de 2010

"A Velha"


Imagem Google

Esculpida em silêncio,
sentada e sábia,
fita o horizonte da mágoa.

Ao seu lado, o mar murmura
as sílabas
do ocaso.

Ó beleza antiga e súbita:
sobre o seu ombro
o instante se debruça,
iluminado.

Adriano Espínola


quarta-feira, 20 de outubro de 2010

"As Tristes Terças"


"Steve Ray Vaughan", de Claudio Saes

Quero os ventos
que agitam pássaros, cabelos, tecidos rústicos. E trapos
meigos.
Quero, derretidas, dos gelos, gotas choradas
e, de poetas, nem flâmulas nem rendas,
só as mágoas.
Das partituras, quero as notas que não são tocadas
e aquelas que, feito minha tristeza, bemolizadas,
só parecem que enfeitam, que flutuam,
que descansam.
Quero, dos blues, as tristes terças.

José P. Di Cavalcanti Jr.


terça-feira, 19 de outubro de 2010

"Viajante Lunar"


"Moonshadow", de Greg Summers

Hoje vi a Lua boiando tranquila,
nas águas de uma lagoa.
Mergulhei os pés na Lua.
Várias Luas surgiram, em torno
de mim,
foram crescendo, crescendo...
Fiquei cercado pelo luar.

Jorge Elias Neto




segunda-feira, 18 de outubro de 2010

"Alvorada"


Imagem Google

Quando você se sentir sozinho, pegue o seu lápis e escreva.
No degrau de uma escada, à beira de uma janela,
no chão do seu quarto. Escreva no ar, com o dedo na água,
na parede que separa o olhar vazio do outro.
Recolha a lágrima a tempo,
antes que ela atravesse o sorriso e vá pingar pelo queixo.
E quando a ponta dos dedos estiverem úmidas,
pegue as palavras que lhe fizeram companhia
e comece a lavar o escuro da noite,
tanto, tanto, tanto... até que amanheça.

Rita Apoena


domingo, 17 de outubro de 2010

"O Fio do Linho"

nickita44
Fotografia de nickita44

Ter um beijo teu guardado nos beirais
Ouvir-te por entre o vento
Subir às árvores, colher todos os frutos
Oferecer cânticos ao silêncio

Ter a tua voz tatuada nas minhas tardes
Prolongar o entardecer
Escutar o desejo
Acompanhar as migrações

Onde guardas os teus pontos cardeais?

Ter uma expansão enorme de chão
A manifestar-se a meus pés
Limitar o olhar, o espaço, o tempo,
A um único instante:
O fio de linho que une
O final da terra e o início do céu.

E tudo se move tão rapidamente

Ter o teu destino cravado no meu corpo
Guardar em segredo
Os teus jardins de fogo
A tua surpresa
Feita de palavras incandescentes

Ter, por fim, os teus rios
A desaguar na minha memória
As cores, as dunas, as flores
Ter uma guerra por dentro
E os teus olhos a perdoar este meu sofrer

in «Penitências de Um Ser no Anonimato»

sábado, 16 de outubro de 2010

"Do Mar"


Fotografia de Byron Jorjorian

Aqueles de um país costeiro, há séculos,
contêm no tórax a grandeza
sonora das marés vivas.
Em simples forma de barco,
as palmas das mãos. Os cabelos são banais
como algas finas. O mar
está em suas vidas de tal modo
que os embebe dos vapores do sal.

Não é fácil amá-los
de um amor igual à
benignidade do mar.

Fiama Hasse Paes Brandão


sexta-feira, 15 de outubro de 2010

"Do prelúdio para acordar sapos (e sapas)"


Cena do Filme "A Princesa e o Sapo", de Walt Disney

Bem te quis
quando era uma vez.

(Bem me quis
de rainha do rei.)

Mal te quis
quando tua veste de gala ruiu.

(Mal me quis
quando meu castelo de areia caiu.)

Mal te quero
por te fingires príncipe, se sapo.

(Mal me quero
quando o espelho mente, e me calo.)

Bem te quero
em um reino de mim tão distante.

(Bem me quero
quando guardo esse livro na estante.)



quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Escultura "Love is somewhwere II", de Dan Fialdini

Cava bem fundo
meu coração,
Se buscas conhecer-me.
A face que tu vês tão risonha diante da vida
Não diz muito,

Não diz tudo

Tu o sabes!

Mas se ainda assim tu não me descobres,
Arranca-me o coração,
Deixa-me o nome,
Devora-o
E vive-me

Maria Jânia Teixeira


quarta-feira, 13 de outubro de 2010


Imagem Google

A que tamanho chega a ferida?
O corte que você fez e não voltou para soprar.
A que tamanho chega o rasgo deixado sem curativo?
Aberto.
Abandonado.
Quanto ainda cresce um buraco que já foi milimétrico?
Um pequeno traço.
A que tamanho chega uma ferida regada todos os dias?
Cultivada por alguém como se fosse flor?

Eduardo Baszczyn


terça-feira, 12 de outubro de 2010


Fotografia By Lissy Elle

Pode haver um dia
em que a poesia
mude de endereço
deixe apenas tédio

mas enquanto isso
vem brincar comigo
vamos até onde
possa ser só riso
possa ir tão longe
possa ser tão lindo
pode ser brinquedo
pode ser tão sério

Alice Ruiz



Feliz Dia das Crianças!!!!


segunda-feira, 11 de outubro de 2010

"A Uma Flor"



Hoje é dia de fotos.
Oh, delicada, universal vaidade,
seria impressão ou recolhes as pétalas
ocultando alguma ruga que desponta?

Mas não me respondas.
Alguns segredos melhor se guardam
no faz-de-conta.

Fernando Campanella


domingo, 10 de outubro de 2010



Eu sou azul
sou azul de corpo
sou azul de alma.
Mesmo no cinza
nos dias
em preto e branco
meu azul
cintilante
sorria.

Edgar Radins


sábado, 9 de outubro de 2010

"Vésper"


Imagem Google

Os poetas praticam
a jardinagem do Universo

Colhem estrelas maduras
no frontispício da tarde

A noite convoca suas doçuras
o alaúde de jasmineiros
a Via Láctea.

Héllio Pellegrino
In Minérios Domados


sexta-feira, 8 de outubro de 2010

"Versos Escritos N' Água


Imagem Google


Os poucos versos que aí vão,
Em lugar de outros é que os ponho.
Tu que me lês, deixo ao teu sonho
Imaginar como serão.

Neles porás tua tristeza
Ou bem teu júbilo, e, talvez,
Lhes acharás, tu que me lês,
Alguma sombra de beleza...

Quem os ouviu não os amou.
Meus pobres versos comovidos!
Por isso fiquem esquecidos
Onde o mau vento os atirou.

Manuel Bandeira


quinta-feira, 7 de outubro de 2010


Fotografia de Mário Quintana

Convivência entre o poeta e o leitor,
só no silêncio da leitura a sós.
A sós, os dois. Isto é, livro e leitor.
Este não quer saber de terceiros,
não quer que interpretem,
que cantem, que dancem um poema.
O verdadeiro amador de poemas
ama em silêncio...

Mário Quintana



quarta-feira, 6 de outubro de 2010

"Venho de Longe"


Albatroz em seu ambiente natural. Nikon D200, Sigma 300mm f/2.8, 1/6400 @ f/4, ISO 400
Fotografia de Octavio Salles

Venho de longe, trago o pensamento
Banhado em velhos sais e maresias;
Arrasto velas rotas pelo vento
E mastros carregados de agonias.

Provenho desses mares esquecidos
Nos roteiros de há muito abandonados
E trago na retina diluídos
Os misteriosos portos não tocados.

Retenho dentro da alma, preso à quilha
Todo um mar de sargaços e de vozes,
E ainda procuro no horizonte a ilha

Onde sonham morrer os albatrozes...
Venho de longe a contornar a esmo,
O cabo das tormentas de mim mesmo.

Paulo Bomfim


terça-feira, 5 de outubro de 2010

"Uma Armadilha no Peito"


Imagem Google

Em madrugadas, vagamente obscuras,
descrevo sombras longínquas,
que perseguem a minha sombra.
Os mais premonitórios sulcos nocturnos
brilham-me nos pés.
Uma armadilha no peito relembra
a exacta adolescência das pálpebras,
quando exibia, no sorriso,
a luz da primavera.
Era menina e havia nos meus olhos tanta fé
que, nem o céu nem o mar excediam,
em grandeza, o meu olhar.


Graça Pires
in 'Não sabia que a noite podia incendiar-se nos meus olhos', 2007



segunda-feira, 4 de outubro de 2010

"Lótus"


Fotografia de © Bocah Bocor 

Meu lago
meu lodo
o todo obscuro da alma.

Ali onde tantos se afogam
eu sonho meu lótus
eu escrevo nas águas.

Fernando Campanella


domingo, 3 de outubro de 2010

"Uma Pétala de Prece"


Imagem Google

Creio nos anjos que andam pelo mundo,
Creio na deusa com olhos de diamantes,
Creio em amores lunares com piano ao fundo,
Creio nas lendas, nas fadas, nos atlantes;

Creio num engenho que falta mais fecundo
De harmonizar as partes dissonantes,
Creio que tudo é eterno num segundo,
Creio num céu futuro que houve dantes,

Creio nos deuses de um astral mais puro,
Na flor humilde que se encosta ao muro,
Creio na carne que enfeitiça o além,

Creio no incrível, nas coisas assombrosas,
Na ocupação do mundo pelas rosas,
Creio que o amor tem asas de ouro. Amém.

Natália Correia


sábado, 2 de outubro de 2010

"Nas mãos, apenas o perfume..."


Girl in a bee dress, de Maggie Taylor

Não aprendi a colher a flor
sem esfacelar as pétalas.
Falta-me o dedo menino
de quem costura desfiladeiros.

Criança, eu sabia
suspender o tempo,
soterrar abismos
e nomear as estrelas.
Cresci,
perdi pontes,
esqueci sortilégios.

Careço da habilidade da onda,
hei-de aprender a carícia da brisa.

Trémula, a haste
me pede
o adiar da noite.

Em véspera da dádiva,
a faca me recorda, no gume do beijo,
a aresta do adeus.

Não, não aprenderei
nunca a decepar flores.

Quem sabe, um dia,
eu, em mim, colha um jardim?

Mia Couto


sexta-feira, 1 de outubro de 2010

"A Idade das Chuvas"


9874663
Fotografia de Anke Merzbach

Quando era infância
tive o meu caderno de chuvas:
algumas rasuradas, outras
fiéis cópias dos deveres do céu.

Quando era infância,
minhas chuvas eram as águas
do que poderiam ter sido:
fruto de rios bem cursados.

Mas herdei a chuva ancestral
que põe umidade na alma
e passa o ano a acarinhar
a palidez das poças de lama.

E é a mesma água que ainda sonha
os grandes oceanos.

André Ricardo Aguiar

Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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