Arte: Serena Bonnano
Guarda-me
adormecida para sempre no teu peito
ou deixa-me voar uma vez mais sobre
esta terra de ninguém onde morro
por qualquer coisa que me fale de ti
Há noites assim em que o silêncio
se transforma ao de leve numa lâmina
que minuciosamente rasga o linho
onde ficou esquecido o corpo que habitamos
em provisórias madrugadas felizes
em provisórias madrugadas felizes
Depois é só abrir os braços e acreditar
que ainda faltam muitas horas para a partida
e que à-toa pelos corredores ainda escorre
uma razão primeira a trazer-me de volta
E eu adormecida para sempre
no teu peito
E eu acorrentada para sempre
no teu peito
E de novo entre nós aquele choro de quem
não teve tempo de preparar a despedida
com as palavras certas;
porque as palavras certas
estavam todas em histórias erradas
que outros escreveram em lugares nublados
que nem vale a pena tentar recompor
Muito ao longe uma voz desgarrada
estabelece o fim do verão
E eu adormecida para sempre
no teu peito
e eu acorrentada para sempre
no teu peito
Alice Vieira
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