Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina

terça-feira, 31 de agosto de 2010

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Imagem Google
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Eu
estava dormindo e acordaram-me
... e me encontrei num mundo incerto e louco!
mas quando eu começava a compreendê-lo
um pouco
já eram horas de dormir de novo...

Mario Quintana

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segunda-feira, 30 de agosto de 2010

"Visita à Casa Paterna"

fotografia daqui
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A minha irmã Isabel.

Como a ave que volta ao ninho antigo,
Depois de um longo e tenebroso inverno,
Eu quis também rever o lar paterno,
O meu primeiro e virginal abrigo.

Entrei. Um gênio carinhoso e amigo,
O fantasma talvez do amor materno,
Tomou-me as mãos, - olhou-me, grave e terno,
E, passo a passo, caminhou comigo.

Era esta sala... (Oh! se me lembro! e quanto!)
Em que da luz noturna à claridade,
minhas irmãs e minha mãe... O pranto

Jorrou-me em ondas... Resistir quem há de?
Uma ilusão gemia em cada canto,
Chorava em cada canto uma saudade.

Luís Guimarães Júnior


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domingo, 29 de agosto de 2010

"Flutuações"

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Young Girl Sleeping - Paul Gauguin
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O sonho aprendeu a pairar bem alto,
lá onde o sobressalto nem sequer nasceu.
Namorou a trôpega ilusão,
até que trêfego e desajeitado,
desprendeu-se de seu reino idealizado,
veio pousar tamborilante em minha mão.
Assim, aquecido e aconchegado,
parece que se esqueceu de ir embora.
Na hora em que ressona distraído,
eu lhe pingo malemolências ao ouvido,
à sua inquietação eu me sujeito.
Eis que o sonho dorme agora aqui comigo,
seu corpo repousa no meu peito.

Flora Figueiredo

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sábado, 28 de agosto de 2010

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Todos os dias, a natureza nos envia passarinhos de presente.

Envolvidos com nossas preocupações,
nem sempre percebemos que eles estão voando ao redor,
dando mais beleza e graça à vida.

Esteja atento aos presentes da vida
e disposto a abrir suas asas para voar com os passarinhos!

Roberto Shinyashiki

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sexta-feira, 27 de agosto de 2010

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Não apaguem as nossas estrelas.
Elas são tão poucas; roucas
(Alguns dizem que são loucas),
De tanto falarem
E poucos escutarem.

Não apaguem as nossas estrelas
Muitos dizem que são insanas;
Que são todas doidivanas,
Mas, igual a Bilac, eu as escuto
"Pálido de espanto".

Hilda Hilst

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quinta-feira, 26 de agosto de 2010

"Memória"

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Em meu dedo
o teu dedal

(tento, mãe
costurar tua memória
prender-te ao que me resta)

Incertos pontos
que a vista embaçada
não deixa urdir

Dalila (Isabel Agrela) Teles Veres

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quarta-feira, 25 de agosto de 2010

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Fotografia do album de Luka1
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Que rua é esta que nos separa
ao longo da qual seguro a mão dos meus pensamentos
uma flor está escrita na ponta de cada dedo
e o fim da rua é uma flor que caminha comigo.

Tristan Tzara

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terça-feira, 24 de agosto de 2010

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Imagem Google
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Ninguém sabe andar na rua como as crianças.
Para elas é sempre uma novidade,
é uma constante festa transpor umbrais.
Sair à rua é para elas muito mais do que sair à rua.
Vão com o vento.
Não vão a nenhum sítio determinado,
não se defendem dos olhares das outras pessoas
e nem sequer, em dias escuros, a tempestade se reduz,
como para a gente crescida,
a um obstáculo que se opõe ao guarda-chuva.
Abrem-se à aragem.
Não projetam sobre as pedras, sobre as árvores,
sobre as outras pessoas que passam, cuidados que não têm.
Vão com a mãe à loja,
mas apesar disso vão sempre muito mais longe.
E nem sequer sabem que são a alegria de quem as vê passar e desaparecer.


Ruy Belo
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segunda-feira, 23 de agosto de 2010

"Fanatismo"

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Florbela Espanca
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Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

«Tudo no mundo é frágil, tudo passa...»
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
«Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!...

Florbela Espanca

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domingo, 22 de agosto de 2010

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Imagem Google
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Não sei se te vejo.
A luz escurece
e essa é a cor do tempo a passar.
Os meus cabelos negros.
O meu vestido negro.
Na terra, nas ervas, nas árvores,
o negro cobre superfícies cada vez maiores.
A noite chega lentamente e
estende-se sobre as coisas em pequenas poças de negro.
E o negro do meu vestido escurece ainda mais.

(...)

José Luís Peixoto

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segunda-feira, 16 de agosto de 2010

"Comunicado"

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Imagem Google
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Só por hoje
vou rasgar os códigos.
Desacato as regras,
a água morna,
os preços módicos.
Só por hoje
desacredito das retas,
descarrilho do trilho,
desvio das setas.

Preciso de tempo pra sonhar,
respirar fundo e carregar na mão
o sal da vida e o mel do mundo.

Se o compromisso tocar a campainha,
peço que aguarde na casa vizinha,
mansamente, sem fazer alarde.
Mas comunico a todos pela imprensa
que sumiu a lucidez.
Pediu licença.
É só por hoje,
mas agora é minha vez.

Flora Figueiredo

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domingo, 15 de agosto de 2010

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Vincent van Gogh, "Starry Night Over the Rhone"
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Assim que anoiteceu, saiu para pescar. Peixes não, estrelas.
Afastou-se da casa, atravessou um campo até o seu limite.
Na linha do horizonte, sentado à beira do céu, abriu a caixa das frases poéticas que havia trazido como iscas.
Escolheu a mais sonora, prendeu-a firmemente na rebarba luzidia.
Depois, pondo-se de cabeça para baixo, lançou a linha no imenso azul, deixando desenrolar todo o molinete.

E paciente, enquanto a Lua avançava sem mover ondas, começou a longa espera de que uma estrela viesse morder o seu anzol.

Marina Colassanti

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sábado, 14 de agosto de 2010

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Ilustração de Brad Holland
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Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...

Mario Quintana

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sexta-feira, 13 de agosto de 2010

A utopia está lá no horizonte

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(Desenho de Gustavo Ganso)
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A utopia está lá no horizonte.
Me aproximo dois passos,
ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos
e o horizonte corre dez passos.
Por mais que eu caminhe,
jamais alcançarei.
Para que serve a utopia?
Serve para isso:
para que eu não deixe de caminhar.

Eduardo Galeano

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quinta-feira, 12 de agosto de 2010

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imagem daqui
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Não
Não: devagar.
Devagar, porque não sei
Onde quero ir.
Há entre mim e os meus passos
Uma divergência instintiva.
Há entre quem sou e estou
Uma diferença de verbo
Que corresponde à realidade.
Devagar...
Sim, devagar...
Quero pensar no que quer dizer
Este devagar...
Talvez o mundo exterior tenha pressa demais.
Talvez a alma vulgar queira chegar mais cedo.
Talvez a impressão dos momentos seja muito próxima...
Talvez isso tudo...
Mas o que me preocupa é esta palavra devagar...
O que é que tem que ser devagar? ...

Álvaro de Campos

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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

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Imagem Google
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Eu me arrebentei, assim, porque o nó era fraco.
Frouxo. Mal dado.
Eu afundei, em segundos, porque no meu casco
havia um buraco milimétrico por onde o mar entrou, aos poucos.
Inteiro.
Eu caí com o primeiro vento porque não havia tijolos.
Eu era construção mal feita. Erguida na pressa.
Madeira com pregos mal batidos.
Fachada.
Eu derreti ao sol porque era de plástico.

Sumi no sopro porque era pó.

Eu me quebrei na primeira queda porque, por dentro,
não havia mais nada.
Eu me sentia forte, sem saber que já era oco.

Eduardo Baszczyn

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terça-feira, 10 de agosto de 2010

"A Ausente"

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Imagem Google
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Os que se vão, vão depressa,
Ontem, ainda, sorria na espreguiçadeira.
Ontem, dizia adeus, ainda da janela,
Ontem vestia, ainda o vestido tão leve cor-de-rosa.

Os que se vão, vão depressa,
Seus olhos grandes e pretos há pouco brilhavam,
Sua voz doce e firme faz pouco ainda falava,
Suas mãos morenas tinham gestos de bênçãos.

No entanto hoje, na festa ela não estava,
Nem um vestígio dela, sequer.
Decerto, quase todos, indiferentes e desconhecidos.

Os que se vão, vão depressa,
Mais depressa que os pássaros que passam no céu,
Mais depressa que o próprio tempo,
Mais depressa que a bondade dos homens,
Mais depressa que os trens correndo nas noites escuras,
Mais depressa que a estrela fugitiva,
Que mal fez um traço no céu.

Os que se vão, vão depressa.
Só no coração do poeta, que é diferente dos outros corações,
Só no coração sempre ferido do poeta,
É que não vão depressa os que se vão,
Ontem sorria na espreguiçadeira,
E o seu coração era grande e infeliz,
Hoje, na festa ela não estava, nem a sua lembrança,
Vão depressa, tão depressa os que se vão ...

Augusto Frederico Schmidt

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segunda-feira, 9 de agosto de 2010

"As Meninas"

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Raparigas à janela, Murillo, Sevilha, 1618/1682
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Arabela abria a janela
Carolina ergia a cortina
e Maria apenas sorria
Bom dia
Arabela foi sempre a mais bela
Carolina a mais sábia menina
e Maria apenas sorria
Bom dia
Pensaremos em cada menina que vivia naquela janela
Uma que se chamava Arabela
Outra que se chamava Carolina
Mas a nossa profunda saudade é Maria, Maria, Maria
que dizia com voz de amizade
Bom dia!

Cecilia Meireles

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domingo, 8 de agosto de 2010

"As Mãos do Meu Pai"

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Foto by Dave Bowman
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As tuas mãos tem grossas veias como cordas azuis
sobre um fundo de manchas já de cor de terra
- como são belas as tuas mãos
pelo quanto lidaram, acariciaram ou fremiram da
nobre cólera dos justos.

Porque há nas tuas mãos, meu velho pai, essa beleza
que se chama simplesmente vida.
E, ao entardecer, quando elas repousam nos braços
da tua cadeira predileta,
uma luz parece vir de dentro delas...

Virá dessa chama que pouco a pouco, longamente,
vieste alimentando na terrível solidão do mundo,
como quem junta uns gravetos e tenta acendê-los
contra o vento?

Ah! Como os fizeste arder, fulgir, com o milagre das
tuas mãos!
E é, ainda, a vida que transfigura das tuas mãos nodosas...
essa chama de vida – que transcende a própria vida
...e que os Anjos, um dia, chamarão de alma.

Mario Quintana

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Um carinho a todos os pais, no dia de hoje...

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sábado, 7 de agosto de 2010

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imagem2.png
Fotografia daqui
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A cidade está deserta
e alguém escreveu o teu nome em toda a parte
nos carros, nas casas, nas pontes, nas ruas
em todo o lado essa palavra
repetida ao expoente da loucura
para nos lembrar que o amor é uma doença
ora amarga, ora doce
quando nele julgamos ver a nossa cura

Manuel Cruz

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sexta-feira, 6 de agosto de 2010

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Inspiração
Fotografia de Belitah
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Eu hei de escrever teu nome
Num pedaço de vento
Na lista do mercado
Num importante documento
E eu hei de tatuá-lo
Enquanto pulsa meu coração
Por toda minha mente
No ar de meu pulmão
Só para não esquecer
Esse teu doce nome
Que sempre consome
Toda minha inspiração

Cáh Morandi

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quinta-feira, 5 de agosto de 2010

"Noite de Verão"

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Summer in New York, de Miro Sinovcic
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As árvores gotejam do aguaceiro.
Na relva molhada reluz o frio
luar. No vale, o invisível rio
reboa escuro com inquieta voz.

No casario ladram cães. Ó noite
de verão e de estrelas mal veladas:
como seduz, vossa pálida estrada,
meu coração ébrio de espaço e viagem!

Hermann Hesse

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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

"Travessura"

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Fotografia de Borges
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Ah, menino...
Também corri muito
atrás dos mesmos arranhões que você.
Papai-do-Céu nos observava
e as estrelas eram mais inatingíveis, não é?
E a bola
era o mundo
que batia no muro.
Todos os doces
machucavam nossos sorrisos...
Que fizemos dos sonhos,
menino?
Foi a vida que se tornou um
esconde-esconde.

Agostina Akemi Sasaoka

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segunda-feira, 2 de agosto de 2010

"Petição"

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Fotografia de Dany Arsic
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Vai...
madrugada
insone

me desperte
com o beijo do sol
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Cláudia Gonçalves

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domingo, 1 de agosto de 2010

"Aula de Desenho"

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Imagem daqui
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Estou lá onde me invento e me faço:
De giz é meu traço. De aço, o papel.
Esboço uma face a régua e compasso:
É falsa. Desfaço o que fiz.
Retraço o retrato. Evoco o abstrato
Faço da sombra minha raiz.
Farta de mim, afasto-me
e constato: na arte ou na vida,
em carne, osso, lápis ou giz
onde estou não é sempre
e o que sou é por um triz.

Maria Esther Maciel

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Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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