Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina
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terça-feira, 26 de maio de 2020

Os amantes

 
Desconheço a autoria da imagem

Os amantes, em geral,
passam noites inteiras
inquietos e ansiosos
- também eu.

Os amantes, em geral,
choram sobre as cartas,
dão telefonemas aflitos
- como eu.

Os amantes, em geral,
passam horas figurando
o corpo amado,
curvas, gestos, preferências
- como eu.

Os amantes em geral,
são patetas, maus estetas,
fazem versos ruins
e se chamam poetas
- como eu.

Affonso Romano de Santana





sábado, 11 de abril de 2020

Silêncio amoroso


Imagem: The Celestial Consonance, Dorina Costras

Não pergunte, não se explique, deixe
que nossas línguas se toquem, e as bocas
e a pele
falem seus líquidos desejos.
Deixa que eu te ame sem palavras
a não ser aquelas que na lembrança ficarão
pulsando para sempre
como se amor e vida
fossem um discurso
de impronunciáveis emoções.

Affonso Romano de Sant’ Anna



quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Catando os cacos do caos



Catar os cacos do caos
como quem cata no deserto
o cacto
- como se fosse flor.

Catar os restos e ossos
da utopia
como de porta em porta
o lixeiro apanha
detritos da festa fria
e pobre no crepúsculo
se aquece na fogueira erguida
com os destroços do dia.

Catar a verdade contida
em cada concha de mão,
como o mendigo cata as pulgas
no pelo
- do dia cão.

Recortar o sentido
como o alfaiate-artista,
costurá-lo pelo avesso
com a inconsútil emenda
à vista.

Como o arqueólogo
reunir os fragmentos,
como se ao vento
se pudessem pedir as flores
despetaladas no tempo.

Catar os cacos de Dionísio
e Baco, no mosaico antigo
e no copo seco erguido
beber o vinho
ou sangue vertido.

Catar os cacos de Orfeu partido
pela paixão das bacantes
e com Prometeu refazer
o fígado
- como era antes.

Catar palavras cortantes
no rio do escuro instante
e descobrir nessas pedras
o brilho do diamante.

É um quebra-cabeça?
Então
de cabeça quebrada vamos
sobre a parede do nada
deixar gravada a emoção

Cacos de mim
Cacos do não
Cacos do sim
Cacos do antes
Cacos do fim

Não é dentro
nem fora
embora seja dentro e fora
no nunca e a toda hora
que violento
o sentido nos deflora.

Catar os cacos
do presente e outrora
e enfrentar a noite
com o vitral da aurora

Affonso Romano de Sant’Anna


Imagem de Pinterest.com



quarta-feira, 8 de agosto de 2018

A implosão da mentira


Mentiram - me.
Mentiram - me ontem
e hoje mentem novamente.
Mentem de corpo e alma completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.
Mentem, sobretudo impunemente.
Não mentem tristes,
alegremente mentem.
Mentem tão nacionalmente
que acho que mentindo história afora,·vão enganar a morte eternamente.
Mentem, mentem e calam,
mas as frases falam e desfilam de tal modo nuas
que mesmo o cego pode ver a verdade
em trapos pelas ruas.
Sei que a verdade é difícil e para alguns
é cara e escura,
mas não se chega à verdade pela mentira
nem à democracia pela ditadura.
Evidentemente crer que uma flor nasceu
em Hiroshima
e em Auschwitz havia um circo
permanentemente.
Mentem, mentem caricaturalmente,
mentem como a careca mente ao pente,
mentem como a dentadura mente ao dente
mentem como a carroça à besta em frente,
mentem como a doença ao doente,
mentem como o espelho transparente
mentem deslavadamente como nenhuma
lavadeira mente
ao ver a nódoa sobre o rio
mentem com a cara limpa e na mão
o sangue quente,

mentem ardentemente como doente nos
seus instantes de febre,
mentem fabulosamente
como o caçador que quer passar gato por lebre
e nessa pilha de mentiras a caça é que
caça o caçador
e assim cada qual mente indubitavelmente.
Mentem partidariamente,
mentem incrivelmente,
mentem tropicalmente,
mentem hereditariamente,
mentem, mentem e de tanto mentir
tão bravamente
constroem um país de mentiras diariamente.

Affonso Romano de Sant'Anna

Imagem Google


quinta-feira, 6 de julho de 2017

A Fala de Deus


Pintura de Zhou Zhongyao

Houve um tempo em que Deus falava hebraico

Passou depois a falar latim
Após um rápido estágio pelo grego.

Atualmente há quem afirme que optou pelo inglês
Embora em algumas tribos
Xamãs se comunique com os seus
em incompreensíveis dialetos.
Isto apenas prova
que Deus é poliglota
Se não por que inventaria a Torre de Babel?

Só não entendo por que alguns se apresentam
como seus tradutores e intérpretes
quando ele claramente fala pela voz dos pássaros e das flores

ou quando pela boca das bactérias
destrói ( silencioso )
nossa empáfia verbal.

Affonso Romano de Sant"Anna


quinta-feira, 25 de abril de 2013

O amor não se adia



Desconheço a autoria da imagem

Certas coisas
não se podem deixar para depois,
e nisto incluo: frutos no galho,
mudanças sociais,
certas coxas e bocas
e esta manhã que se esvai.

Certas coisas
não se podem deixar para depois.

O amor não se adia
como se adiam o imposto, a viagem, a utopia.
O desejo sabe o que quer,
detesta burocracia.

Affonso Romano de Sant'Anna





quarta-feira, 20 de março de 2013

"O Homem E Sua Sombra"




- Que sombra estranha me deram!
(o homem conjeturava
pois sua sombra
não andava).

Estática
ficava ancorada
onde bem lhe apetecia.

O homem a chamava
ela não se mexia.

Desguarnecido de sua sombra
seu dono já não sabia
se a ia ou se ficava.

Não ia
a parte alguma.
Ao redor da própria sombra
circulava.

Affonso Romano de Sant´Anna




quarta-feira, 16 de novembro de 2011

"Um Homem e Sua Sombra"

Fotografia de Hurtadoc, no Flickr

Um homem deixou de alimentar
a sombra que carregava. Alegou razões de economia.

Afinal para quê de sobejo levar algo que o duplicava?

Sem sombra, pensou
melhor carregaria o que nele carregava.

Equivocou-se. Definhou.
Descobriu, então, que a sombra o sustentava.

Affonso Romano de Sant'Anna


quarta-feira, 13 de julho de 2011

Crepusculando



Fotografia de Ione Castilho

É inenarrável esse crepúsculo
em mim se desmaiando
essas cigarras acima do ruído urbano
essas flores no terraço cúmplices

me olhando.
É inenarrável esse céu
esse dia
em mim se desmanchando.

Ergo um brinde à luz
e sigo
crepusculando.

Affonso Romano de Sant'Anna 



sexta-feira, 3 de setembro de 2010

"O Homem e Sua Sombra 2"

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Fotografia de Nelson
.
Era um homem que pensava tão claro
que nenhuma dúvida
o sombreava
Era como se raciocinasse sempre
ao meio-dia
quando o pensamento
é um copo ereto
que sombra alguma esconderia.
O problema era à noite
quando o escuro mundo
o envolvia:
tentava pensar claro, tentava
mas algo o incomodava
até que descobriu que a claridade
só ganhava sentido
quando com escuridão
dialogava.

Affonso Romano de Sant’Anna

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domingo, 2 de maio de 2010

Leitura Natural

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Fotografia de João Parassu
.
Tendo lido os jornais
— infectado a mente, e nauseado os olhos —
descubro, lá fora, o azul do mar
e o verde repousante que começa nas samambaias
da sala
e recrudesce nas montanhas.

Para que perco tantas horas do dia
nessas leituras necessárias e escarninhas?
Mais valeria, talvez, nas verdes folhas, ler
o que a vida anuncia.

Mas vivo numa época informada e pervertida.
Leio a vida que me imprimem
e só depois
o verde texto que me exprime.

Affonso Romano de Sant’Anna

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terça-feira, 22 de dezembro de 2009

"A Primeira Vez Que Entendi"

.
.
A primeira vez que entendi do mundo
alguma coisa
foi quando na infância
cortei o rabo de uma lagartixa
e ele continuou se mexendo.

De lá pra cá
fui percebendo que as coisas permanecem
vivas e tortas
que o amor não acaba assim
que é difícil extirpar o mal pela raiz.

A segunda vez que entendi do mundo
alguma coisa
foi quando na adolescência me arrancaram
do lado esquerdo três certezas
e eu tive que seguir em frente.

De lá pra cá
aprendi a achar no escuro o rumo
e sou capaz de decifrar mensagens
seja nas nuvens
ou no grafite de qualquer muro.

Affonso Romano de Sant'Anna

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sexta-feira, 17 de julho de 2009

"O Duplo"

.
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Debaixo de minha mesa
tem sempre um cão faminto
- que me alimenta a tristeza.
Debaixo de minha cama
tem sempre um fantasma vivo
- que perturba quem me ama.
Debaixo de minha pele
alguém me olha esquisito
- pensando que eu sou ele.
Debaixo de minha escrita
há sangue em lugar de tinta
- e alguém calado que grita.
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Affonso Romano de SantAnna
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sábado, 13 de junho de 2009

"Cilada Verbal"

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Há vários modos de matar um homem:
com o tiro, a fome, a espada
ou com a palavra
- envenenada.
Não é preciso força.
Basta que a boca solte
a frase engatilhada
e o outro morre
- na sintaxe da emboscada.
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Affonso Romano de Sant'Anna
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quinta-feira, 21 de maio de 2009

"O Amor e o Outro"

.
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Não amo
melhor
nem pior
do que ninguém.
.
Do meu jeito amo
Ora esquisito, ora fogoso,
às vezes aflito
ou ensandecido de gozo.
Já amei
até com nojo.
.
Coisas fabulosas
acontecem-me no leito. Nem sempre
de mim dependem, confesso.
O corpo do outro
é que é sempre surpreendente
.
Affonso Romano de Sant'Anna
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quinta-feira, 23 de abril de 2009

"Silêncio Amoroso 2"

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Preciso do teu silêncio
cúmplice
sobre minhas falhas.
Não fale.
Um sopro, a menor vogal
pode me desamparar.
E se eu abrir a boca
minha alma vai rachar.
O silêncio, aprendo,
pode construir.
É um modo
denso/tenso
- de coexistir.
Calar, às vezes,
é fina forma de amar.
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Affonso Romano de Sant´Anna
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sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

"Chegando Em Casa"

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Chegando em casa
com a alma amarfanhada
e escura
das refregas burocráticas
leio sobre a mesa
um bilhete que dizia:
- hoje 22 de agosto de 1994
meu marido perdeu, deste terraço:
mais um pôr de sol no Dois Irmãos
o canto de um bem-te-vi
e uma orquídea que entardecia
sobre o mar.
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Affonso Romano de Sant'Anna

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

"Assombros"

.
.
Às vezes, pequenos grandes terremotos
ocorrem do lado esquerdo do meu peito.
Fora, não se dão conta os desatentos.
Entre a aorta e a omoplata rolam
alquebrados sentimentos.
Entre as vértebras e as costelas
há vários esmagamentos.
Os mais íntimos
já me viram remexendo escombros.
Em mim há algo imóvel e soterrado
em permanente assombro.
.
Affonso Romano de Sant'Anna

sábado, 18 de outubro de 2008

"A Primeira Vez que Entendi"

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A primeira vez que entendi do mundo alguma coisa,
foi quando na infância cortei o rabo de uma lagartixa
e ela continuou se mexendo.
De lá pra cá fui percebendo
que as coisas permanecem vivas e tortas,
que o amor não acaba assim,
que é difícil extirpar o mal pela raiz.
.
A segunda vez que entendi do mundo alguma coisa,
foi quando na adolescência me arrancaram do lado esquerdo
três certezas e eu tive que seguir em frente.
.
De lá pra cá aprendi a achar no escuro o rumo
e sou capaz de decifrar mensagens,
seja nas nuvens ou no grafite de qualquer muro.
.
Affonso Romano de Sant'Anna

terça-feira, 17 de junho de 2008

"Silêncio Amoroso 1"

.
.
Deixa que eu te ame em silêncio
Não pergunte, não se explique, deixe
que nossas línguas se toquem, e as bocas
e a pele
falem seus líquidos desejos.
.
Deixa que eu te ame sem palavras
a não ser aquelas que na lembrança ficarão
pulsando para sempre
como se o amor e a vida
fosse um discurso
de impronunciáveis emoções.
.
Affonso Romano de Sant'Anna

Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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