Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina

quinta-feira, 30 de setembro de 2010


Imagem Flickr

Bolha de sabão é que nem silêncio:
a gente pode dizer que não existe.
É uma das coisas mais bonitas do mundo:
colorida de todas as cores do arco-íris,
toda redonda, voando livre, leve e alto.
João disse (sem falar) pro menino:
a vida da gente pode ser uma bolha de sabão
(...)
Se a gente aprende a ser colorido,
a voar livre, leve e alto até explodir bonito,
sem muito barulho,
deixando no ar uma gotinha de saudade.

Luiz Raul Machado
in João Teimoso


quarta-feira, 29 de setembro de 2010







 Imagem via Pinterest 

No descomeço era o verbo.
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo,
lá, onde a criança diz:
eu escuto a cor dos passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar
não funciona para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um verbo,
ele delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta,
que é a voz de fazer nascimentos
- O verbo tem que pegar delírio.

Manoel de Barros



terça-feira, 28 de setembro de 2010

"Prece"


Imagem Google

Dê-me o esquecimento, meu pai.
Dê-me uma noite sem sombra
ou sobressalto, um sono inteiro
um instante sem rumor.
Dê-me teu silêncio, meu pai.
A solidez das pedras, o rigor das coisas
a solidão sem dor.

Maria Esther Maciel


segunda-feira, 27 de setembro de 2010

8



Sopra um vento em Pequim.
Árvores altíssimas respiram pássaros.
Entre eles é fácil ouvir o que sobra
do movimento dessa luz.
O vento me ergue pelos braços, me leva à copa
da mais alta árvore.
Agarrado aos galhos não sinto medo de nada.
Daqui de cima posso ver
que a esquina sopra com o vento.

E assim igual o vento,
passa minha vida,
entre a pedra e a flor.

Fernando Karl
In Esquina,China e Outros Poemas


domingo, 26 de setembro de 2010


Imagem daqui

Se os ramos dão na vidraça
e os choupos estremecem,
é para que em minha mente
chegues devagarinho.

Se as estrelas, na lagoa
alumiam as profundezas,
minha dor se alivia
acalma-se o meu espírito.

E se as nuvens se dissipam
e a lua resplandece,
é para que, de ti,
eu me lembre eternamente.

Mihail Eminesco
In Antologia da Poesia Romena


sábado, 25 de setembro de 2010

"Que Diferença Faz às Flores..."



Fotografia de Pinterest

Que diferença faz às flores
se por um segundo as contemplo?
Nem sei se algo no mundo
precisa de meu olhar assim atento.
Se me procuras, em teu espelho
por um tempo me reflito.
Depois ao cálice de mim retrocedo.
Eu sou o velho vinho que me bebo
de minha embriaguês me contento.

Fernando Campanella
"O Eu Confesso", XXX.



sexta-feira, 24 de setembro de 2010

"Luz do Fim"



O vento petrificado...
Sombra e silencio a descer,
O horizonte ensangüentado
Lembra florestas a arder.

No horizonte todo em chama,
Maré-cheia de rubim,
O rubim do sol derrama
A luz vermelha do fim ...

Anrique Paço D'Arcos


quinta-feira, 23 de setembro de 2010

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Fotografia Martin Cederblad
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Mas é certo que a primavera chega.
É certo que a vida não se esquece,
e a terra maternalmente se enfeita
para as festas da sua perpetuação.
Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim.
Algum dia, talvez,
os homens terão a primavera que desejarem,
no momento que quiserem,
independentes deste ritmo,
desta ordem, deste movimento do céu.
E os pássaros serão outros,
com outros cantos e outros hábitos,
— e os ouvidos que por acaso os ouvirem
não terão nada mais com tudo aquilo que,
outrora se entendeu e amou.

Cecília Meireles

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quarta-feira, 22 de setembro de 2010


Casa Abandonada - Frio
Fotografia de Paola Sansão

Única sobrevivente
de uma casa desabada
- só eu me achava acordada.

E recordo a minha gente,
na noite sem madrugada.
Só eu me achava acordada.

Minha morte é diferente:
eles não souberam nada.
Só eu me achava acordada.

Mas quem sabe o que se sente,
entre ir na casa afundada
e ter ficado – acordada!?

Cecília Meireles
In: Canções (1956)


terça-feira, 21 de setembro de 2010

"Das Pedras"


Imagem daqui

Ajuntei todas as pedras
que vieram sobre mim.
Levantei uma escada muito alta
e no alto subi.
Teci um tapete floreado
e no sonho me perdi.
Uma estrada,
um leito,
uma casa,
um companheiro.
Tudo de pedra.
Entre pedras
cresceu a minha poesia.
Minha vida...
Quebrando pedras
e plantando flores.
Entre pedras que me esmagavam
Levantei a pedra rude
dos meus versos

Cora Coralina


segunda-feira, 20 de setembro de 2010

"Regalo"

Fotografia de Fernando Campanela

Quando meu pai
voltava da roça
trazia, além da alegria
garrafas de leite cru.
Às vezes, cestas de ovos
mangas maduras
polvilho, açafrão em pó.
Trazia o cheiro das coisas
sem malícia. A memória
dos pastos.
O azul.

Maria Esther Maciel


domingo, 19 de setembro de 2010

"Derramei Três Lágrimas"

Without You
"Without You", de © Zindy S. D. Nielsen

Derramei três lágrimas
A primeira escorreu pela face
E perdeu-se na boca
A segunda morreu achatada
Contra o assoalho...
A terceira caiu na tua mão...
E foi essa a que mais doeu...

Caio Fernando de Abreu


sexta-feira, 17 de setembro de 2010

"Mulher ao Espelho"

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"Venus ao Espelho", Velázquez
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Hoje que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.

Já fui loura, já fui morena,
já fui Margarida e Beatriz.
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.

Que mal faz, esta cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se tudo é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?

Por fora, serei como queira
a moda, que me vai matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.

Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.

Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.

Cecília Meireles

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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

"Quando Chegares"

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Imagem Google
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Não sei se voltarás
sei que te espero.

Chegues quando chegares,
ainda estarei de pé, mesmo sendo dia,
mesmo que seja noite, ainda estarei de pé.

A gente sempre fica acordado
nessa agonia,
à espera de um amor que acabou sendo fé...

Chegues quando chegares,
se houver tempo, colheremos ainda frutos, como ontem,
a sós;
se for tarde demais, nos deitaremos à sombra e
perguntaremos por nós...

J. G. de Araujo Jorge

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quarta-feira, 15 de setembro de 2010

"Amar"

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Toujour L'amour - Vintage Couple Notecard
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Fechei os olhos para não te ver
e a minha boca para não dizer...

E dos meus olhos fechados
desceram lágrimas que não enxuguei,
E da minha boca fechada
nasceram sussurros

E palavras mudas que te dediquei...

Mario Quintana

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terça-feira, 14 de setembro de 2010

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"Beijo de Mar", de Octavio Ocampo
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O mundo é grande e cabe
nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
no breve espaço de beijar.

Carlos Drummond de Andrade

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segunda-feira, 13 de setembro de 2010

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Arte de Duy Huynh
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A todos os ventos
eu peço coragem.

A cada estrela e estrada
Ao mar que não morre nunca
eu peço coragem.

E ao sol e à lua
E a todo o firmamento.

A cada pássaro
A cada pedra
A cada bicho da terra e do ar
Peço coragem a tudo o que vive agora
E ainda viverá
Coragem para cavalgar os dias
Navegar nas horas
E a cada minuto e segundo sonhar.

Roseana Murray

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domingo, 12 de setembro de 2010

"Galanteios"

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Imagem Google
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O vento da madrugada
assobiava galanteios
pra lua despudorada
que tomava banho nua
numa poça da calçada

Téia Borda de Lima

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sábado, 11 de setembro de 2010

"Vida de Mosteiro"


Imagem: Tumblr

Clarissas em silêncio
Carmelitas descalças
Eu, neste apartamento

Tuca Kors


sexta-feira, 10 de setembro de 2010

"Pacifismo"

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flor_de_papel.jpg
Imagem daqui
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Das folhas dos pinheirais
faz-se a folha de papel
e faz-se o papel-dinheiro...

Dos seios dos seringais,
do seu leite empedernido,
sangrado através das rachas,
autores e industriais
nutrem-se até da borracha.

Daí, se ouvimos dizer,
que a literatura pode ser
das armas, a mais cruel,
é talvez devido ao fato
de que o ato de escrever,
com conseqüências funestas,
traga em seu bojo aborteiro
a matança de pinheiros,
e a extinção de florestas.

Leila Míccolis

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quinta-feira, 9 de setembro de 2010

"Eu"

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"Tristeza", de Mariela Monica Montes
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Até agora eu não me conhecia,
julgava que era Eu e eu não era
Aquela que em meus versos descrevera
Tão clara como a fonte e como o dia.

Mas que eu não era Eu não o sabia
mesmo que o soubesse, o não dissera...
Olhos fitos em rútila quimera
Andava atrás de mim... e não me via!

Andava a procurar-me - pobre louca!-
E achei o meu olhar no teu olhar,
E a minha boca sobre a tua boca!

E esta ânsia de viver, que nada acalma,
E a chama da tua alma a esbrasear
As apagadas cinzas da minha alma!

Florbela Espanca

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quarta-feira, 8 de setembro de 2010

"Com Licença Poética"

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"Didn't call birdy", by Katerina Belkina
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Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
essa espécie ainda envergonhada.
Aceito subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa me casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado

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terça-feira, 7 de setembro de 2010

"Quintanares"

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Mário Quintana
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Meu Quintana, os teus cantares
Não são, Quintana, cantares:
São, Quintana, quintanares.

Quinta-essência de cantares...
Insólitos, singulares...
Cantares? Não! Quintanares!

Quer livres, quer regulares,
Abrem sempre os teus cantares
Como flor de quintanares.

São cantigas sem esgares.
Onde as lágrimas são mares
De amor, os teus quintanares.

São feitos esses cantares
De um tudo-nada: ao falares,
Luzem estrelas luares.

São para dizer em bares
Como em mansões seculares
Quintana, os teus quintanares.

Sim, em bares, onde os pares
Se beijam sem que repares
Que são casais exemplares.

E quer no pudor dos lares.
Quer no horror dos lupanares.
Cheiram sempre os teus cantares

Ao ar dos melhores ares,
Pois são simples, invulgares.
Quintana, os teus quintanares.

Por isso peço não pares,
Quintana, nos teus cantares...
Perdão! digo quintanares

Manuel Bandeira
in Coletânea 80 anos de Poesia.
Editora Globo, 1986


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domingo, 5 de setembro de 2010

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2anjo.jpg image by doceamor
Imagem Google
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No dia em que pensei em morrer,
Ela me sorriu. Tudo era escuro
Mas ainda assim ela era linda
Quando eu a quis ela disse não
Um não sorrindo que não me magoou
um não tão lindo que parecia sim
E que entre tantos nãos, caiu gostoso
dizendo sim

Naquela noite escura ela era meu único sim

Vladimir Maiakovsk

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sábado, 4 de setembro de 2010

"Perdas e Ganhos"

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Fotografia de Rosie Hardy
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Fruto de enganos ou de amor,
nasço de minha própria contradição.
O contorno da boca,
a forma da mão, o jeito de andar
(sonhos e temores incluídos)
virão desses que me formaram.
Mas o que eu traçar no espelho
há de se armar também
segundo o meu desejo.
Terei meu par de asas
cujo vôo se levanta desses
que me dão a sombra onde eu cresço
- como, debaixo da árvore,
um caule,
e uma flor.

Lya Luft

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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

"O Homem e Sua Sombra 2"

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Fotografia de Nelson
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Era um homem que pensava tão claro
que nenhuma dúvida
o sombreava
Era como se raciocinasse sempre
ao meio-dia
quando o pensamento
é um copo ereto
que sombra alguma esconderia.
O problema era à noite
quando o escuro mundo
o envolvia:
tentava pensar claro, tentava
mas algo o incomodava
até que descobriu que a claridade
só ganhava sentido
quando com escuridão
dialogava.

Affonso Romano de Sant’Anna

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quinta-feira, 2 de setembro de 2010

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Imagem Google
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Nesta curva tão terna e lancinante
que vai ser
que já é o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura
por ti.

Alexandre O'Neill

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quarta-feira, 1 de setembro de 2010

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Imagem Google
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O que aconteceria se você dormisse?
E depois sonhasse?
E no sonho fosse até o céu e
colhesse uma estranha e bela flor?
E quando acordasse,
tivesse a flor nas mãos?

Ah! E então?

Samuel Coleridge

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Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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