Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina
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quinta-feira, 2 de julho de 2020

Não digas que eu não estava à janela

 
 Fotografia de Lisette Model 

Não digas que eu não estava à janela,
que não foi para ti o que não viste.
Há tanta coisa que não sabes, não digas.
Um dia ver-me-ás à janela de ontem
com a roupa que hei-de vestir amanhã.
Até lá pensa que me sonhaste. Nem eu mesma sei
o que fiz nesse dia. Mas a janela guarda os meus dedos
como tu me guardas. O tempo é uma invenção recente.
Era uma vez essa mulher que viste. Retira o vidro,
a moldura, e não te esqueças de abrir o horizonte.

Rosa Alice Branco




sábado, 23 de maio de 2020

O teu coração dorme comigo

 
 Imagem via Pinterest
 
Aceitar o dia. O que vier.

Atravessar mais ruas do que casas,
mais gente do que ruas. Atravessar
a pele até ao outro lado. Enquanto
faço e desfaço o dia. O teu coração
dorme comigo. Agasalha-me as noites
e as manhãs são frias quando me levanto.
E pergunto sempre onde estás e porque
as ruas deixaram de ser rios. Às vezes
uma gota de água cai ao chão
como se fosse uma lágrima. Às vezes
não há chão que baste para a enxugar.

Rosa Alice Branco



 

sexta-feira, 1 de maio de 2020

Manhãs no chão


Desconheço a autoria da imagem

Aceitar o dia. O que vier.

Atravessar mais ruas do que casas,
mais gente do que ruas. Atravessar
a pele até ao outro lado. Enquanto
faço e desfaço o dia. O teu coração
dorme comigo. Agasalha-me as noites
e as manhãs são frias quando me levanto.
E pergunto sempre onde estás e porque
as ruas deixaram de ser rios. Às vezes
uma gota de água cai ao chão
como se fosse uma lágrima. Às vezes
não há chão que baste para a enxugar.

Rosa Alice Branco




quarta-feira, 15 de abril de 2020

A divisibilidade dos aromas



Imagem via Pinterest

Pela janela vem o cheiro da manhã, da relva
e das rosas salpicadas de fresco que se casam com o cheiro
dos lençóis sonolentos. Ao bater a porta já só sinto
o meu perfume, o que pomos por cima das certezas
e das dúvidas, por cima dos segredos que trespassam a pele.
Em breve me confundirei com o cheiro dos outros, daquele homem
vergado pelo saco de batatas, da florista a compor as margaridas,
da peixeira à porta da vizinha mostrando as goelas sangrentas
(talvez porque se tenha levantado cedo e apregoar assim
fere a garganta), das crianças a caminho da escola, de todos
os que hão-de cruzar o meu dia e de ti que hás-de cruzar
também a minha noite. Contar-te-ei todas as horas com a mistura
dos aromas que me compõem e ouvirei na tua pele
a sutil diferença entre os dias. Amanhã fecharemos a porta
e o teu cheiro irá entranhado em mim até uma distância infinita
das rosas que cantam à janela e seguirei pela estrada
estendendo a pele às dádivas do dia.

Rosa Alice Branco




A letra mais pequena



Fotografia de Dalva Nascimento

Caminhas na praia. As sandálias nas dunas
junto à erva agreste de outros dias. O sol
não te queima, não te fere os olhos ao meio-dia.
Soletramos o amor com a letra mais pequena de uma língua
acabada de inventar. Sabem as gaivotas. Sabe o mar.
Era uma vez. Era assim que te agasalhava a noite
e me enrolava nos teus olhos para encontrar
a luz. Não é com a memória que caminho.
As manhãs de névoa como as camarinhas
que cresciam nas dunas. Com quem posso
agora falar de camarinhas? Saborear o gosto
das bagas e dos risos. Vamos apanhando conchas,
castelos, príncipes, borboletas. Vamos perdendo
o que encontramos. As mãos vazias. Os passos leves.
Os olhos crescem como a erva nas sandálias.

Rosa Alice Branco




Cenário com os pés de fora

 
 Imagem da Web

Deitamo-nos com a cama por fazer.
Uma pilha de blusas cai. Chão de verão.
Amor à tardinha com a vida desarrumada,
as coisas ao meio. Até o silêncio está
desarrumado. Gosto desse cenário.
Há nele uma verdade que nem mesmo sei.
O meu quarto antigo sempre em desalinho
com os livros no chão ao pé da cama. Sentir
que a vida não é uma coisa útil e as horas,
e tu menos ainda, sem dobra no lençol
e os pés de fora. Foi isto que quis
a minha vida. Sem buraco do ozônio,
sem buraco de fome ou de balas
atravessando os lençóis do mundo.

Rosa Alice Branco





Carícia divina



 Imagem da Web

Cordeiro do Senhor nunca queiras escravo.
A hóstia branca que levamos à boca
é a mesma lua cheia que ilumina
o meu corpo a deslizar no teu.
Porque deus é amor e nós fi éis.
Porque nos fez com uma carícia
assim te acaricio e me cobres
de felicidade pela noite dentro.
Bendito seja quem assim ama.
Livrai-nos Senhor de todos os cordeiros
e dai-nos um ao outro cada dia.

Rosa Alice Branco



Passos sem memória




Fotografia de Salo RJ

Olho pela janela e não vejo o mar. As gaivotas
andam por aí e a relva vai secando no varal. Manhã cedo,
o mar ainda não veio. Veio o pão, veio o lume
e o jornal. A saliva com que te hei-de dizer bom dia.
As palavras são as primeiras a chegar. O que fica delas
amacia o papel. Pão quente com o sono de ontem
e os sonhos de hoje. Prepara-se o dia, os passos
de ir e vir. Estou cada vez mais perto. Olhas-me
como se soubesses o que hei-de saber mais logo.
Nesta cidade nunca é meio-dia. Há sempre uma doçura
de outras horas. E recordações avulsas. Deixa-as sair
de dentro do vestido, deixa soltar as ondas do mar.
A janela está vazia. O meu filho caminha na praia
e tu soletras as gaivotas. Caminha à minha frente
sem deixar pegadas. Perco-me como todas as mães,
todos os amantes. Invento passos e palavras
para adormecer. A esta hora a minha avó enrolava o rosário
nas mãos. Eu estava dentro das contas, dentro do sono
que rondava a prece. Durante muito tempo estive fora.
Agora caminhamos juntos. Sem memória.

Rosa Alice Branco




O "aqui" acorda o mundo do poema


 Imagem da Web

O "aqui"
acorda no mundo do poema
e ressuscita-me.

Não digas o meu nome.
Toca-me com a doçura do arco
e diz: "tu" ou
"estás aqui".
São palavras voadoras
que nunca falham o alvo.

Rosa Alice Branco



 

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

"Mensagem Silenciosa"



By Doc

Os sentidos reúnem-se à mesa do jantar,
as vozes misturam-se com os cheiros
da terra,
com o gosto do amor em cada prato;
os dedos cruzam-se no pão que inventamos
verso a verso,
no olhar a palavra da mãe que se levanta
e eu atrás
com o laço de verão no vestido
que se desaperta.
A mão da mãe enlaça os sentidos,
dá um nó, o amor preso a toalha
da mesa - não penses,
nunca penses no laço que se abre,
no corpo que se fecha,
nas migalhas dispersas pelo chão:
deixa só o vestido voar
em redor do tempo.

Rosa Alice Branco


Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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