Estou de volta... como a primavera!

"Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa..."

Manuel Antonio Pina

terça-feira, 28 de maio de 2013


Arte de Ana Pardo

Por fora, 
trago o sabor 
da amora; 

por dentro, 
uma saudade 
que devora. 

Por fora, 
comemoro 
a vida; 

por dentro, 
sou veia cava 
obstruída. 

Por fora, 
um banquete 
sobre a mesa; 

por dentro, 
essa dinamite 
acesa. 

Morreu o cravo, 
sonhando 
a margarida. 

Pelo próprio espinho, 
se fez a rosa, 
ferida. 

Por fora, 
a poesia move; 

por dentro, 
o verso suicida.

Marcos Caiado


segunda-feira, 27 de maio de 2013

"De Amor"



Despede-te de mim, bate devagar a porta:
tenho vontade de recomeçar, reerguer escombros,
ruínas, tarefas de pão e linho, não dar
nome às coisas senão o de um vago esquecimento,

abandono. Despede-te de mim como se a vida
recomeçasse agora, não me procures onde
a memória arde e o destino se ausenta.

Tudo são banalidades, afinal, quando assim
se recomeça e a vida falha como um material
solar e ilhéu. Levamos poucas coisas, basta
um pouco de ar, os objetos fixos, em repouso,

os muros brancos de uma casa, o espaço
de uma mão. Arrumo as malas e os sinais,
aquilo que nos adormece em plena tempestade.

Francisco José Viegas
(de 'O medo do Inverno', Metade da Vida)


sábado, 25 de maio de 2013

"Não chegamos a ser"


Fotografia de José Luis Mendes

Não chegamos a ser 
Aconchego nas manhãs de domingo
passeio na praia, mãos dadas no jardim

paixão em noites de amor
brisa nas tardes de calor
estréia de filme em sessão lotada

Não chegamos a ser
inverno, meia e cobertor
primavera ou verão
nem acordo ou discussão

Não chegamos a ser paciência, 
nem mesmo fomos sem pressa
nem taça gelada de Ano Novo
sequer um presente de Natal

Não chegamos a ser
reticências, evasivas
nem talvez.

Sequer chegamos a ser.

Dalva Nascimento


sexta-feira, 24 de maio de 2013


Mulher Pássaro, de Roberto Fabelo


Solidão?
quem sabe o que estas asas reservaram?
Ganhar espaços, encontrar pousos, permanecer voando.
Apenas me ausento
em determinadas horas
para ver o que fazem
alguns seres
que viajaram em mim, um dia.
Sinto tristezas espontâneas
e algumas vergonhas alheias.
Sinto asperezas que não desejo.
Quero, enfim, apenas a liberdade
de voar por mim mesmo.

João Victor Velloso


quinta-feira, 23 de maio de 2013

"Dança"


Fotografia de Marina Hushiro


A menina dança sozinha
por um momento.

A menina dança sozinha
com o vento, com o ar, com
o sonho de olhos imensos...

A forma grácil de suas pernas
ele é que as plasma, o seu par
de ar,
de vento,
o seu par fantasma...

Menina de olhos imensos,
tu, agora, paras,
mas a mão ainda erguida

segura ainda no ar
o hastil invisível
deste poema!

Mário Quintana
In Esconderijos do Tempo



quarta-feira, 15 de maio de 2013

"Desci Um Milhão de Escadas"



Fotografia de Tiago Rosado

Desci, dando-te o braço, ao menos um milhão de escadas
e agora que aqui não estás é o vazio a cada degrau.
Mesmo assim foi breve nossa longa viagem.
A minha dura ainda, mas já não me ocorre pensar
nas conexões, nas reservas,
nas ciladas, nos vexames dos que crêem
que a realidade é aquilo que se vê.

Desci milhões de escadas dando-te o braço
e não porque com quatro olhos talvez se veja melhor.
Contigo as desci porque sabia que de nós dois
as únicas verdadeiras pupilas, ainda que tão ofuscadas,
eram as tuas.

Eugenio Montale


terça-feira, 14 de maio de 2013

"Requiescat"



Fotografia de  Maria Avelino

De meu mar, ofereço-te as ondas
e as poéticas conchas 
que minhas praias te trazem
Tais suaves mistérios te concedo,
mais as algas, e as gaivotas
que bicam tecidos de luz na tarde.

Povoados de ti, de mim, 
os barcos que chegam e ardem.

Adere-te, pois, ao sal que em mim te chama,
molha teus pés em espuma e encanto,
cobre teu rosto
nas claras águas que o dia me abre.

(Sosseguem, minhas dorsais;
Descanse meu leviatã escuso.)

Fernando Campanella


segunda-feira, 13 de maio de 2013

"Procura-se"



Desconheço a autoria da imagem

Procura-se
A aurora desperta pelo azul do mar,
A quietude outonal que rasga o dia,
a vida que ressurge rara após noite escura.

Procura-se
a esperança que saiu voando sem rumo,
uma alma alada como pássaro,
que desapareceu entre o céu e o mar.

Procura-se
sonhos pássaros perdidos na névoa tardia,
ventos leves, leves como o pensamento.

Procura-se
uma chance, uma sorte, uma nova saída,
uma ilha, um pouco de paisagem,
um verso capaz de descrever o instante.

Sônia Schmorantz


domingo, 12 de maio de 2013


Pintura de Almada Negreiros

Só na memória do teu rosto, mãe
posso encontrar agora as paredes
da casa onde nasci.
Como se fosse possível voltar
àquele tempo em que a felicidade
residia nas tuas mãos
entretidas a encaracolar os meus cabelos.

Graça Pires


sábado, 11 de maio de 2013

"Casa Trancada"



Fotografia de Kyle Thompson

Que tipo de casa suburbana é o meu peito
Que guarda entre os seus cômodos vazios,
Vultos, sonhos e os anseios mais sombrios
Que de uma criatura singular é de direito?

Que dores percorrem o corredor estreito
E separa o imóvel como margens de um rio?
Qual foi o erro ou desengano que fez vazio
O espaço outrora alegre que envolve o leito?

Casa vazia. Triste como qualquer casa vazia.
Casa que apagou o sorriso de quem se ria
E se trancou com portas e janelas gradeadas.

Casa vadia. Triste como qualquer casa vadia,
Mas nas paredes ainda há quadros e fotografias
Enquanto a vida roda e continua na calçada.

Danilo del Monte


sexta-feira, 10 de maio de 2013

"Desencanto"



Imagem daqui

E na tarde que foge 
Ao correr vou buscá-la.
Contar-lhe todos meus sonhos
pedir sorrisos ao beijá-la.

Mas. . . silenciosa ela zomba
nem me estende suas mãos,
. . . já é fruto de sombra!

Quero luz! não sua morte.
Mas tão lenta e tão triste
. . . já pressente sua sorte.

Lá vai ela. . . pobre tarde
carregada em soluços.
Traz nas cores tantos mundos
. . . de um só mundo que parte!

Alvina  Nunes Tzovenos


quinta-feira, 9 de maio de 2013

"Este é o Maio"


Desconheço a autoria da imagem

Este é o maio,
O maio é este,
Este é o maio e floresce
Este é o maio das rosas,
Este é o maio das formosas,
Este é o maio e floresce.
Este é o maio das flores.
Este é o maio dos amores,
Este é o maio e floresce.

Gil Vicente


quarta-feira, 8 de maio de 2013

"O Anjo na Escada"



Desconheço a autoria da imagem

Na volta da escada,
Na volta escura da escada.
O Anjo disse o meu nome.
E o meu nome varou de lado a lado o meu peito.
E vinha um rumor distante de vozes clamando
clamando...

Deixa-me!
Que tenho a ver com as tuas naus perdidas?
Deixa-me sozinho com os meus pássaros...
com os meus caminhos...
com as minhas nuvens...

Mario Quintana


terça-feira, 7 de maio de 2013



Arte de Danny O’Connor

Esperava de mãos cruzadas sobre a saia do vestido de sonhos.
Alheada do mundo restante, da luz e da sombra, do branco e do negro. 
Tinha tecido uma teia de cores que ninguém via. 
Sentia-se enredada nela, imobilizada. Nem um dedo mexia, naquela espera. 
Só o vestido ondulava, convite a quem conseguisse olhá-la e ver. 
Mas à volta dela, para lá da teia, todos pareciam cegos. Talvez surdos também. 
Porque, embora quieta no sonho com que se vestia, dela saía um grito 
que podia acordar o mundo. Um terrível grito de silêncio. 

Alice Daniel


segunda-feira, 6 de maio de 2013




Agora sou
porto de silêncio que conhece
a rota da madeira,
porta do sótão
e turbilhão de folhas
que, pela cozinha, arrasta o vento.

Agora sou
a casa que conhece
múrmuras colméias,
unhas do gato prateado,
o desatino matinal dos pássaros
e o amor das janelas pelas nuvens.

Ao perfume da erva
após a chuva
une-se o do café.

Do tempo passado
a decifrarmos juntos paredes
de granito e cal
vem-nos doce a fadiga.
Repousemos.

Flor Campino


domingo, 5 de maio de 2013




Se pudesses ver-me assim 
Como me sinto agora
Triste, cansada, e desajeitada

Sou como um simples rochedo
Que canta melodias antigas
Por entre as fragas soltas
De um altar despido

Encontras-me se quiseres
Sempre na ira dos ventos
Nas incandescentes luzes
Que me deixaram despida
No meio do caminho

Tracei nas mãos 
O nosso destino
E vi-te a atravessá-lo 
No in-exacto momento 
De um único fim

Matilde D' Ônix


sábado, 4 de maio de 2013


Instalação  "LedScape", no Centro Cultural de Belém, em Lisboa (aqui)

Eu te sonho em noite de luares
Em dias de sol e debaixo da chuva.

Eu te canto em versos, em prosa
Em vírgulas e reticências...

Eu te desenho nas nuvens
Na folha branca e no arco-íris.

Eu te vejo nas flores
No vôo dos pássaros
E no brilho dos meus olhos.

Lou Witt


sexta-feira, 3 de maio de 2013


Arte de Mark Keller

Eu amo na frequência que amam os loucos
Eu amo por necessidades de preenchimento
Eu amo até transbordar
Eu amo dos pés a cabeça e
Depois
Amo de ponta Del Leste
Ao agreste que anda meu coração
Eu amo tão desesperadamente
Tão verdadeiramente
Tão sem truques
Planos
E efeitos
Tão sem jogos e conceitos
Que sempre me sobra
Um vazio na mão.

Talles Azigon

quinta-feira, 2 de maio de 2013

"Travessia"



Arte de Karol Bak.

Onde 
tenho estado
onde estou
Para onde foi a minha vida
A vivida
A que está por viver
Se tivesse sido outra
Seria a mesma outra
Não tenho mais vida
Para além desta
Que me vive.

Glória Gervitz


Interlúdio com ...

Will You Still Love Me Tomorrow - Norah Jones

Will You Still Love Me Tomorrow

Norah Jones

Tonight you're mine completely
You give your love so sweetly
Tonight the light of love is in your eyes
Will you still love me tomorrow?

Is this a lasting treasure
or just a moment pleasure?
Can I believe the magic of your sight?
Will you still love me tomorrow?

Tonight with words unspoken
You said that I'm the only one
But will my heart be broken
When the night meets the morning sun?

I like to know that your love
This know that I can be sure of
So tell me now cause I won't ask again
Will you still love me tomorrow?

Will you still love me tomorrow?
Will you still love me tomorrow?...

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